CARF mantém cobrança de CIDE sobre remessas feitas por facilitadora de pagamentos
No julgamento do Recurso Voluntário nº 10880.781020/2021-03, realizado em 19 de setembro de 2024, a 1ª Turma Ordinária da 1ª Câmara da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) validou a cobrança da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) sobre remessas feitas ao exterior a título de repasses, por empresa facilitadora de pagamentos localizada no Brasil.
Detalhes do caso analisado
No caso analisado, a empresa Apple Inc., localizada nos Estados Unidos, celebrava contratos individuais, prestava serviços e licenciava direitos a diversas pessoas físicas no Brasil, por meio da disponibilização de plataformas digitais e serviços de streaming. Contudo, os pagamentos por esses serviços e licenças eram centralizados em uma empresa intermediária, a Apple Serviços de Remessas Ltda., constituída como facilitadora de pagamentos no Brasil, e depois enviados ao exterior de forma unificada.
Nas remessas feitas ao exterior, houve recolhimento de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sob alíquota de 15%, mas não de CIDE, sob o fundamento de que (i) não haveria incidência da referida contribuição na importação de serviços e licenciamento feitos para pessoas físicas (contratantes da Apple Inc.); e (ii) a Apple Remessas não importava serviços nem adquiria licenças, mas apenas prestava serviços de centralização de pagamentos à Apple Inc., repassando os valores recebidos no Brasil.
Entretanto, a Apple Remessas foi autuada para realizar o pagamento da CIDE sobre os valores remetidos ao exterior, sob a alegação de que se tratava de pagamento por serviço técnico.
Fundamentos do acórdão do CARF
A Conselheira Laura Baptista Borges votou por negar provimento ao Recurso Voluntário da Apple Remessas e manteve a exigência de CIDE sobre as remessas ao exterior, justificando que a hipótese de incidência da contribuição abrangeria as pessoas responsáveis por pagar, creditar, entregar, empregar ou remeter valores a título de royalties, mesmo que a empresa não fosse a efetiva licenciadora (art. 2º, §2º da Lei nº 10.168/2000).
Além disso, ela argumentou que a legislação tributária brasileira estabelece diferentes alíquotas de IRRF dependendo do tipo de operação: (i) 25% para rendimentos gerais enviados ao exterior, nos termos do art. 7º da Lei nº 9.779/99; ou (ii) 15% para rendimentos que configuram royalties ou pagamento por prestação de serviços sujeitos à CIDE. Assim, pelo fato de o IRRF recolhido pela empresa nas remessas ao exterior ter sido de 15%, os julgadores interpretaram que esse recolhimento caracterizaria suposta confissão de que os pagamentos se referiam a serviços técnicos, o que atrai a incidência da CIDE.
A Conselheira Sabrina Coutinho Barbosa abriu divergência, entendendo que, ao ser prestado diretamente a pessoas físicas (consumidores finais), o serviço não poderia ser base para a incidência da CIDE, já que a contribuição incide apenas sobre pessoas jurídicas. Além disso, o serviço deveria ser prestado pela Apple Inc. à Apple Remessas, mas esta última atuava como intermediária no Brasil, apenas organizando os pagamentos, ou seja, não era parte no contrato de serviços com os consumidores finais.
No entanto, por maioria de votos (4x2), o CARF manteve a exigência da CIDE sobre as remessas efetuadas, conforme o voto da Conselheira Laura Baptista, por entender que a Apple Remessas havia remetido valores relacionados a serviços técnicos e licenças concedidas por residentes no exterior e recolhido IRRF sob alíquota de 15%, o que reforçaria a vinculação dos pagamentos à incidência da CIDE.
Conclusão do julgamento do CARF
A decisão estabelece um precedente relevante, adotando o entendimento de que há incidência da CIDE em remessas feitas por intermediários financeiros, mesmo quando esses não são signatários de contratos ou licenciadores de direitos com empresas no exterior.
Por essa razão, recomendamos atenção a eventuais estruturas e planejamentos tributários que utilizam empresas facilitadoras de pagamentos em operações internacionais.
Nossa equipe tributária está à disposição para avaliar eventuais impactos da decisão sobre estruturas/planejamentos adotados e nos casos em discussão na esfera administrativa e judicial.
Juan Mendez (juan@vnpa.com.br) | Thiago Vasques (thiago@vnpa.com.br) | Luan Moreira (luan.moreira@vnpa.com.br) | Gabriela Gebrin Domingues (gabriela.domingues@vnpa.com.br)
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